Convites à Publicação

Convites à Publicação

A revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas procura explorar e discutir a possibilidade da transcendência do(s) lugar(es), físico(s) e virtual(is), entendendo-o(s) como espaço(s)/tempo(s) expandido(s), onde local e global surgem como realidades implicadas e dinâmicas. Analisará, com particular atenção, não só os processos geopolíticos, sociais, históricos e culturais de en-contro local e urbano, como também as diversas formas de expressão artística resultantes desses fenómenos, entendendo que estes, na contemporaneidade e seja na cidade do Funchal ou seja em outras coordenadas, sempre implicam quer o desenvolvimento de laços de identificação local, quer a construção de ligações de pertença a diversas redes externas, situáveis para além-do-local.

A TRANSLOCAL edita em formato impresso em papel, um número anual temático, com registo ISSN autónomo da edição online [ISSN 2184-1047], que reunirá trabalhos inéditos e subordinados a uma temática específica, identificada nos respetivos convites à publicação (ver abaixo).

Cada número anual da TRANSLOCAL acolherá com interesse propostas para publicação em três secções da revista:

  • Ensaios
    • escritos
    • visuais (até 5 imagens ou vídeo + texto até 1000 palavras)
  • Artigos
  • Sugestões de Leitura (sob a forma de efetivas recensões críticas ou, em registo mais livre, sob a forma de apontamentos/recomendações de leitura sobre publicações manifestamente relevantes para o entendimento e o debate acerca das culturas contemporâneas locais e urbanas)

As propostas submetidas deverão respeitar as normas de edição da revista (ver aqui) e ser enviadas para o contacto eletrónico oficial da revista, dentro dos prazos definidos em cada convite à publicação:  translocal.revista@mail.uma.pt.

Todos os textos publicados serão objeto de avaliação de acordo com o modelo internacional  double blind peer review.

n.º 6 | BIBLIOTECAS
Coordenador convidado: Martinho Mendes (CIERL/UMa e CEHA-AV/DRABL)
Coordenadora Residente: Ana Salgueiro (UMa-CIERL, CECC-UCP e DRABL)
Convite à publicação  aqui    |  Prazo limite para submissão de propostas: 31.01.2025
 
 A lo largo del tiempo, nuestra memoria va formando una biblioteca dispar, hecha de libros, o de páginas, cuya lectura fue una dicha para nosotros […]. Deseo que esta biblioteca sea tan diversa como la no saciada curiosidad que me ha inducido, y sigue induciéndome, a la exploración de tantos lenguajes y de tantas literaturas. […] Un libro es una cosa entre las cosas […] que pueblan el indiferente universo, hasta que da con su lector, con el hombre destinado a sus símbolos
Jorge Luis Borges, Biblioteca personal, pp.7-8
 
 Julgo que as bibliotecas públicas, depósito de textos tanto virtuais como materiais, são um instrumento essencial para contrariar a solidão. Defendo o seu papel enquanto memória e experiência da sociedade. Diria que, sem bibliotecas públicas, e sem uma compreensão consciente do seu papel, uma sociedade da palavra escrita está condenada ao esquecimento […]. Adoro bibliotecas públicas e são elas o primeiro lugar que visito sempre que chego a uma cidade que não conheço
Alberto Manguel, (2018), Embalando a minha biblioteca, p.27
 
  Em 2012, a Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian e o Museu Calouste Gulbenkian apresentaram a exposição Tarefas infinitas. Quando a arte e o livro se ilimitam, comissariada por Paulo Pires do Vale, curador e ensaísta, cuja reflexão se tem vindo a ocupar dos ilimites do livro (sobretudo, do livro de artista) e, consequentemente, das bibliotecas que com eles se constroem e que, tantas vezes por causa deles, se destroem. No caderno da exposição, Paulo Pires do Vale evoca, não por acaso, a “biblioteca interminável” que Jorge Luis Borges imaginou em 1941, na portuária cidade argentina Mar del Plata, ao escrever o seu conto “La Biblioteca de Babel”. Um conto que, na verdade, relia e reescrevia o arquétipo de biblioteca-mundo que Ptolomeu I decidiu edificar no séc. III a.C, na cidade que Alexandre Magno, anos antes, havia fundado para ser o cosmopolita centro do mundo antigo.
   Referimo-nos à biblioteca de Alexandria que durante cerca de três séculos “abrigou quase toda a memória do mundo mediterrânico” e asiático conhecido, um ambicioso projeto só possível porque, como lembra Alberto Manguel, “os reis ptolemaicos decretaram que qualquer livro dentro do seu reino fosse trazido ou copiado e transportado para a biblioteca” e que todos os livros detetados nos “navios que atracavam em Alexandria” fossem “confiscados pelas autoridades portuárias” e igualmente copiados e incorporados na biblioteca da cidade (MANGUEL, 2018:60). Livros que eram ainda manuscritos em pergaminho ou outros suportes anteriores à tecnologia do papel, organizados em rolos ou tabuinhas, e, portanto, apresentando formatos bem distintos dos que hoje são mais vulgares nas nossas bibliotecas: livros impressos em papel ou disponíveis em formato digital.
   Apesar de se tratar de uma biblioteca histórica, as raras informações documentadas que se conservaram acerca quer da sua fundação e existência, quer da sua ruína contribuíram para a mitificação da Biblioteca de Alexandria, conferindo-lhe uma aura que tem inspirado arquitetos, artistas plásticos, escritores e leitores, instituições e agentes político-administrativos, que a partir dela criaram novas bibliotecas reais, imaginárias. Neste último caso, para além da biblioteca imaginada por Borges em 1941, lembremos a que Umberto Eco (outro excecional bibliotecário) recriou ficcionalmente (também em diálogo com a biblioteca de Borges) no seu O nome da rosa, romance que, na verdade, pode ser lido como um ensaio sobre o livro e as bibliotecas.
   Umberto Eco, no romance e em outros textos, fala-nos de bibliotecas que, como supostamente terá sido a de Alexandria, acolhem textos escritos em qualquer língua ou até em linguagens não exclusivamente verbais e dificilmente legíveis no presente (livros provenientes das mais díspares áreas do saber, dos mais remotos tempos e das mais distantes localidades geográfica e culturais), sendo concebidas e geridas como espaços abertos. Bibliotecas que, por essa sua abertura, poderão colocar em risco a sobrevivência material dos livros que arquivam e têm à sua guarda, mas que, para além de repositórios bibliográficos empenhados em assegurar a preservação dos livros e a reprodução controlada do saber antigo, se assumem como verdadeiros centros de germinação e atualização translocal de (novos) conhecimentos. Uma dinâmica que, afinal, pretende dar resposta à interminável curiosidade referida por Borges, tornando essas bibliotecas instrumentos fundamentais para o crescimento cultural, científico, tecnológico e cívico dos leitores e das suas comunidades. Mas Umberto Eco fala-nos também de um outro tipo de bibliotecas, identificáveis com a da abadia medieval visitada por Guilherme e Adso em O nome da rosa. Em contraponto ao modelo anterior, estas são bibliotecas fechadas sobre si mesmas, geridas por supostos guardiões escolhidos pelos seus proprietários ou por quem detém o poder para lhes conferir essa tarefa e que, seguindo apertados protocolos de acesso aos livros, controlam o que pode ou não ser lido e quem pode ou não a eles aceder. Estas são bibliotecas sobretudo pensadas como espaços de monumentalização de (certos) livros, particularmente entregues à preservação material dos seus acervos (tornados secretos e quase intocáveis), mas que, na verdade, desvalorizam aquele que, para Borges e Eco, é o mais importante fim de um livro e de uma biblioteca: serem encontrados pelos seus leitores e pelas suas leitoras, i.e., serem lidos por quem nele encontrar o labirinto de respostas e de novas perguntas que alimentam a sua curiosidade acerca do mundo e de outros livros ainda desconhecidos ou até por escrever.
   No caderno da exposição Tarefas infinitas que começámos por citar, Paulo Pires do Vale reflete neste mesmo sentido:
    “Abrir um livro é correr o risco de encontrar o infinito. Ter ao alcance da mão, nos limites da página, o sem-limite […]. Nesse espaço aberto e branco da página, nas suas dobras, pode surgir o sem princípio, nem fim, nem centro: o Livro infinito. Liberdade que é também desorientação: perdem-se as certezas e as referências habituais; […]./ Entre as mãos abre-se uma fenda. Uma entrada inesperada que altera a ordem do mundo. Um abismo. Ou uma casa – que oferece um outro modo de hospitalidade […]. Explosão de palavras, ideias, imaginação, sentidos – que destroem e recriam o horizonte de possibilidades em que nos movemos. E exigem de nós: faz, pensa, vê, sê […]. Os autores contaminam-se. […]. As leituras cruzam-se criando novos sentidos […]. Os livros são perigosos: ateiam-nos fogo. Temíveis; por isso, são atirados ao fogo […]. A biblioteca interminável de Babel […] não se limita[…] ao tempo da vida de um indivíduo e são criação comunitária. […] Vêm de longe e dirigem-se para longe” (VALE, 2012: s. pp.).
   Assim, pensadas simultaneamente como casas e abismos, onde a sedução pela liberdade e pelo encontro com o desconhecido surge associada ao risco da desorientação caótica e do desencontro com identidades e alteridades, as bibliotecas são, não apenas espaços promotores de translocalidade (com tudo o que de criativo e perigoso existe nas suas dinâmicas), como também são espaços de saber-poder, com um relevante papel na redefinição constante das comunidades em que se localizam e que ajudam a construir. Conhecer uma biblioteca (pública ou privada) permite-nos afinal, como argumenta Geoffrey Robert acerca da biblioteca de Estaline, descobrir segredos, valores, modos de pensar e viver dos seus proprietários, dos seus bibliotecários e da sociedade que habitam e que nela habita.
   Não é por acaso que o século XIX (período em que a Europa e a América assistiram à formação das sociedades liberais e à criação e legitimação dos novos Estados-Nação) é considerado, por alguns autores, como o século das bibliotecas. Tendo como referência o caso português, verificamos que esse foi, de facto, o tempo em que, com o fim do Antigo Regime e a extinção das ordens religiosas, Portugal assistiu ao desmantelamento das seculares bibliotecas monásticas, cujos valiosos acervos – até então apenas acessíveis a algum clero e a alguns escolares – foram transferidos para as novas bibliotecas públicas, generalistas, especializadas ou técnicas. Bibliotecas entre as quais destacamos as primeiras bibliotecas municipais (de que a do Funchal, fundada em  janeiro de 1938, é um claro exemplo, sobrevivendo até hoje, como a quarta biblioteca pública portuguesa mais antiga) e em que o regime liberal português investiu significativamente, pensando-as, justamente, como dispositivos de saber-poder.
   A este respeito, Maria de Fátima M. M. Pinto (2017) sustenta que as bibliotecas públicas e populares do séc. XIX se inscreviam num plano mais alargado de construção de uma nova sociedade orientada pelos valores liberais de Igualdade, Justiça Social e Progresso, para o qual concorriam a alfabetização e a democratização do acesso à cultura e ao saber, que, na época, tinham como pilares fundamentais os jornais e o livro, este último ainda um bem muito dispendioso e a que as camadas sociais menos abastadas apenas conseguiam aceder através da leitura pública. Por outro lado, enquanto dispositivos que salvaguardavam acervos bibliográficos, gerindo o seu acesso e a sua divulgação, as bibliotecas tinham também o poder de controlar os valores e as narrativas que legitimavam e asseguravam a manuteção do modelo sociopolítico que o regime liberal instaurava no país. Algo que, na verdade, continuou a acontecer durante a I República, o Estado Novo e o pós 25 de Abril, embora ao serviço de projetos políticos distintos.
   Assim sendo, o n.º 6 da revista TRANSLOCAL Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas, tendo “Bibliotecas” como tema de capa, acolherá com interesse propostas de ensaios escritos e artigos (entre 2500 e 5000 palavras), ensaios visuais (até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras), e recensões críticas (entre 1000/2000 palavras), que, ocupando-se de questões relacionadas com o tema “Bibliotecas” – aqui entendido em sentido literal, mas também em sentido metafórico -, abordem (não exclusivamente) tópicos como:
   » as artes plásticas, o cinema, a literatura como bibliotecas;
   » a biblioteca e o seu nomos (a sua lei):  liberdades, libertinagens, censuras e/ou interditos;
   » bibliotecários/as e leitores/as extraordinários/as;
   » bibliotecas, acessibilidades e políticas de promoção da leitura;
   » bibliotecas de artistas, de autores, de figuras públicas destacadas e de instituições;
   » bibliotecas históricas, míticas e ficcionais;
   » bibliotecas, materialidades e tecnologias do livro;
   » imaginação e edificação de bibliotecas: o passado, o presente e o futuro;
   » o livro de artista: questionação/reinvenção da biblioteca contemporânea;
   » o papel das bibliotecas enquanto lugares de saber-poder na cidade e no mundo contemporâneos: desafios e oportunidades;
   » …
   As propostas para publicação (texto completo + eventuais imagens) poderão ser redigidas em português, inglês ou espanhol e deverão ser enviadas para o email da revista (translocal.revista@mail.uma.pt) até 31.01.2025, fazendo-se acompanhar, em documento autónomo, de:
   * um resumo do texto (até 200 palavras), em duas línguas, sendo que uma delas deverá ser o inglês;
   * nome do(s) autor(es) e uma breve nota curricular (até 100 palavras).
   Seguindo os critérios internacionais de dupla avaliação cega por pares, as propostas submetidas serão validadas ou recusadas, tendo em consideração os seguintes critérios: contributo para a reflexão em torno do tema de capa do n.º 6 da TRANSLOCAL; rigor científico e sustentação argumentativa atualizada; qualidade da expressão escrita; respeito pelas normas de edição adotadas pela revista e que se encontram disponíveis aqui.
   Até 15.04.2025, a coordenação da revista informará os autores das propostas que forem aceites e, após a conclusão do processo de revisões finais e paginação, a revista será publicada no segundo semestre de 2025.
 
Referências bibliográficas:

AAVV (1983), “A leitura pública em Portugal – Manifesto”, Cadernos de Biblioteconomia, Arquivística e Documentação, n.º1/1983, Lisboa: Associação Portuguesa de Bibliotecários Arquivistas e Documentalistas.

BORGES, Jorge Luis (2004), “La biblioteca de Babel”, Ficciones, Madrid:  Alianza Editorial, pp. 86-99. 

BORGES, Jorge Luis (2008), Biblioteca personal, Madrid: Alianza Editorial.

COUTINHO, Manuel Carvalho (2024), A Biblioteca. Uma segunda casa, Lisboa: FFMS.

ECO, Umberto (s.d.), O nome da rosa, trad.  Maria Celeste Pinto, 3.ª ed., Lisboa: Difel.

ECO, Umberto, 2002, A biblioteca, trad. Maria Luísa de Freitas, Lisboa: Difel. 

MANGUEL, Alberto (2018), Embalando a minha biblioteca. Uma elegia e dez divagações, trad. Rita Almeida Simões, Lisboa: Tinta-da-china.

PINTO, Maria de Fatima Machado Martins (2017), Bibliotecas populares em Portugal: práticas e representações. Esboçar de uma missão (1870-1930), tese de doutoramento, Lisboa: IE-UL.

ROBERTS, Geoffrey (2023), A Biblioteca de Estaline. Um ditador e os seus livros, trad. Frederico Pedreira, Lisboa: Zigurate.

VALE, Paulo Pires do, ed. (2012), Tarefas Infinitas. Quando a arte e o livro de ilimitam. Caderno de Exposição, Lisboa: FCG/Museu Calouste Gulbenkian e Biblioteca de Arte.

 
n.º 5 (2022) | TRADUÇÃO
Coordenador Convidado: Jerónimo Pizarro (Universidad de los Andes, Cátedra de Estudos Portugueses Fernando Pessoa)
Coordenadora Residente: Ana Salgueiro (UMa-CIERL, CECC-UCP e DRABM/CEHA-AV)
 
Convite à publicação em português aqui  Novo prazo para submissão de propostas: 15 out. 2023
Call for publication in English  here    New deadline: 15 October 2023
“Nothing is translatable […] Everything is translatable”
Emily Apter (2006), “Twenty theses on translation”, The Translation Zone, pp. xi-xii
 
“Aprender a hablar es aprender a traducir; cuando el niño pregunta a su madre por el significado de esta o aquella palabra, lo que realmente le pide es que traduzca a su lenguaje el término desconocido. La traducción dentro de una lengua no es, en este sentido, esencialmente distinta a la traducción entre dos lenguas, y la historia de todos los pueblos repite la experiencia infantil […]. El asombro, la cólera, el horror o la divertida perplejidad que sentimos ante los sonidos de una lengua que ignoramos, no tarda en transformarse en una duda sobre la que hablamos […] Cada texto es único y, simultáneamente, es la traducción de otro texto […]. Pero […] todos los textos son originales porque cada traducción es distinta. Cada traducción es, hasta cierto punto, una invención y así constituye un texto único”
Octavio Paz (2009 [1970]), “Traducción: literatura y literalidad”, pp. 8-14
 
….Em 2009, no seu “A mobility studies manifesto”, Stephen Greenblatt assumia que a mobilidade é uma dinâmica decisiva na construção das culturas, não ignorando que a transferência cultural e os cruzamentos daí emergentes são condicionados por assimetrias de poder nem sempre evidentes, mas potenciadoras do risco de conflitos, de hegemonias e de exclusões. Essa mobilidade terá sido, desde sempre, o verdadeiro motor da construção cultural, mesmo quando nos reportamos a sistemas culturais conservadores ou mais insulados, que se definem por uma maior fixidez dos seus valores e circunstâncias; fixidez não raras vezes confundida com a falácia da pureza étnica e da fidelidade a uma cultura original. Porém, no mesmo manifesto, Greenblatt interrogava o proclamado triunfo do cosmopolitismo e as teorias que conceberam o contemporâneo como um campo inovadoramente fértil em hibridismos, chamando a atenção para o logro epistemológico e o risco político que a aceitação acrítica destas “verdades” podericconstituir. Neste sentido, afirmava: “Cultures are almost always apprehended not as mobile or global or even mixed, but as local […] strikingly enmeshed in particular times and places and local cultures […]. Indeed one of the characteristic powers of a culture is its ability to hide the mobility that is its enabling condition […]. A study of cultural mobility that ignores the allure (and, on occasion, the entrapment) of the firmly rooted simply misses the point. Theory and descriptive practice have to apprehend how quickly such a sense of the local is often established and also how much resistance to change the local, even when it is of relatively recent and mixed origin, can mount” (GREENBLAT, 2009: 252-253).….Polémicas e merecedoras de debate (como, de resto, se espera de um manifesto), as palavras de Greenblatt, contudo, têm a virtude de nos levar a pensar os sistemas culturais (e em particular os contemporâneos) como lugares de permanente tensão e negociação entre, por um lado, mobilidade, transformação e (r)evolução (LOPES e MONIZ, 2022: 7); e, por outro, resistência à diferença e ao novo, apostando na fixação de fronteiras geopolíticas, históricas, linguísticas ou até disciplinares e conceptuais. O desafio lançado por Greenblatt acompanha, assim, o “translational turn” verificado nos Estudos de Cultura a partir das últimas décadas do século XX, propondo um entendimento das constelações culturais como zonas de tradução, ou (citando Emily Apter), como “sites that are ‘in-translation’”: lugares onde se situam “the epistemological interstices of politics, poetics, logic, cybernetics, linguistics, genetics, media, and environment” (APTER, 2006: 6).
….Como nota Doris Bachmann-Medick, este “translational turn” no estudo das culturas acompanhou o “cultural turn” operado na área dos Estudos de Tradução, cujo objeto de estudo foi sendo gradualmente alargado, assumindo não raras vezes significações metafóricas (BACHMANN-MEDICK, 2016:175-176). Num tempo pós-moderno, pós-colonial e globalizado, onde as fronteiras se tornaram mais porosas, as relações de poder se complexificaram e as hierarquias perderam a rigidez que haviam mantido durante largos séculos, o conceito de tradução libertou-se do paradigma linguístico-textual e de categorias e questões que ocuparam o seu estudo ao longo de séculos (original, equivalência, fidelidade…). Embora não esquecendo estas questões e os muitos desafios linguísticos, textuais e representacionais colocados no processo de transferência de um texto de uma língua de partida para outra língua de chegada, num gesto que é sempre de apropriação recriativa (ora mais domesticadora, ora mais estrangeirizante), os Estudos de Tradução, adotando este novo conceito alargado de tradução, passaram também a ocupar-se de outros processos de trânsito, transferência, transformação, apropriação e/ou resistência recontextualizadoras operados (de forma nem sempre visível) em domínios não apenas verbais e literários, como os das práticas antropológicas e sociais, dos discursos não verbais, dos modelos estéticos, das metodologias, dos conceitos e valores, das diferentes áreas disciplinares do conhecimento.
,,,,Reconhecendo-se a complexidade, a transversalidade e a relevância que a mobilidade cultural e, consequentemente, os processos tradutórios hoje assumem, a tradução passou, assim, a constituir uma categoria de análise imprescindível não só para o estudo e a compreensão da relação entre textos e línguas, mas também, de forma mais alargada, para o estudo e a compreensão dos próprios sistemas ecossocioculturais e académicos, quer no que diz respeito à tessitura das suas identidades e à (in)definição das suas fronteiras, quer no que diz respeito às dinâmicas de poder que sempre lhes subjazem.
….Assim sendo, enquanto revista que se ocupa do estudo, da análise crítica e da divulgação de fenómenos culturais contemporâneos locais e urbanos, a TRANSLOCAL elege a tradução como tema de capa do seu n.º 5, convidando investigadores/as, tradutores/as, artistas e outros/as agentes culturais a repensar, a promover e a desocultar os fenómenos tradutórios estruturantes dos atuais sistemas culturais: os do Funchal e da ilha da Madeira, onde a revista é editada; mas também os de outras geografias, nomeadamente os da América Latina (e em particular os da Colômbia, desde logo por mediação de um conjunto de autores e tradutores de poesia cujos trabalhos serão publicados neste n.º5), onde a tradução desde muito cedo foi assumida como condição política, quer na redefinição identitária, quer na relação com outros e diversos mundos (BALDERSTON e SCHWARTZ, 2018: xxviii-xxix).….Acolher-se-ão com interesse propostas de ensaios escritos e artigos (entre 2500 e 5000 palavras), ensaios visuais (até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras), e recensões críticas (entre 1000/2000 palavras), que, ocupando-se de questões associadas aos fenómenos de tradução (aqui entendidos em sentido lato), abordem (não exclusivamente) tópicos como:
  • a (não) tradução como política: nacionalismos, cosmopolitismos e translocalidades;
  • a tradução como poética na literatura e/ou em outras artes;
  • economia e pragmática da tradução;
  • Estudos de Tradução: estado da arte e/ou novas perspectivas;
  • História da tradução;
  • (po)éticas de tradução: desafios, potencialidades e riscos recriativos e interculturais;
  • projetos de tradução (projetos editoriais, coleções, manifestos, etc.): casos de estudo;
  • tradutores/as e outros/as agentes de tradução: invisibilidades e desocultação;
  • práticas emergentes de tradução no mundo digital.

….As propostas para publicação serão avaliadas de acordo com os critérios internacionais de dupla avaliação cega por pares, e serão aceites trabalhos em português, em inglês e em espanhol, que contribuam para a reflexão em torno do tema e das problemáticas da tradução e que respeitem as normas de edição adotadas pela revista e aqui disponibilizadas. Os textos redigidos em português poderão seguir ou não a norma do Acordo Ortográfico de 1990, devendo o/a autor/a declarar a opção seguida, em nota.

….As propostas (texto completo e eventuais imagens) deverão ser enviadas até 30 de junho de 2023 15 de outubro de 2023, para a coordenação da revista (translocal.revista@mail.uma.pt), incluindo também os seguintes elementos:
….– um resumo da proposta de texto submetida (até 200 palavras), em duas línguas, sendo uma delas a língua utilizada no texto: português e inglês, para textos escritos em português; espanhol e inglês, para textos escritos em espanhol; ou inglês e português, para textos escritos em inglês
….– nome do(s) autor(es) e uma breve nota curricular (até 100 palavras).….Até 31 de julho de 2023 30 de novembro de 2023, a coordenação da revista informará os autores das propostas que forem aceites e, após a conclusão do processo de revisões finais e paginação, a revista será publicada no último trimestre de 2023.

 
n.º 4 (2021) | ANTÓNIO ARAGÃO, antena receptiva (1921 – 2008)
Secção ENSAIOS VISUAIS – submissão de propostas até 31.07.2021                                             Convite à Publicação em Português aqui 
Secção DIÁLOGOS – submissão de propostas até 15.06.2021                                                       Call for Publication in English soon 
Coordenadores Convidados:  Rui Torres (Universidade Fernando Pessoa e Arquivo Digital da PO.EX) e Bruno Ministro (ILCML-UP e Arquivo Digital da PO.EX)
Coordenadora TRANSLOCAL: Ana Salgueiro (UMa-CIERL, CECC-UCP e DRABM/CEHA-AV)
Nascido a 21.09.1921, na pequena localidade de São Vicente, situada na costa norte da Ilha da Madeira, António Aragão viria a assumir um inegável destaque quer no sistema cultural madeirense, quer no sistema cultural português, através de um percurso intelectual e artístico que sempre procurou fazer pontes com outros sistemas culturais (Itália, Brasil, Espanha, E.U.A, Japão, etc.) e de uma obra plural (Arqueologia, Arquivística, Artes Visuais, Etnografia, História, Literatura), fortemente marcada pelas dinâmicas da transgressão (não raras vezes subversiva), da busca de encontros culturais, estéticos e discursivos improváveis, da experimentação de métodos, técnicas e materialidades discursivas inusitados, da transferência e da recontextualização criativa.

Habitante provisório de várias cidades europeias (Lisboa, Coimbra, Paris, Roma,…), onde viria a realizar a sua formação académica, a regressar pontualmente e a estabelecer uma importante rede de afinidades eletivas que se ramificariam, depois, por outras coordenadas geoculturais e que manteria ativa até ao final da vida (11.08.2008), António Aragão escolhe o Funchal como cidade de residência e de trabalho a partir dos anos 1960, não sendo por isso de estranhar que a paisagem e o património histórico e antropológico desta localidade insular (entre tantas outras do arquipélago) tenham sido objeto da sua atenção em trabalhos de História, de Etnografia ou até de Urbanismo.

Porém, a escolha desta localização e o interesse pelo sistema cultural madeirense não inibiram que, a partir do Funchal, António Aragão mantivesse também um intenso e continuado diálogo com artistas, projetos e organizações situados em outras geografias nacionais e internacionais, num claro alinhamento com o ecumenismo poético internacional que ele próprio, mais tarde, identificaria como motor fundamental da Poesia Experimental Portuguesa, movimento interartístico e antissistema de que ele foi um dos principais dinamizadores. O desenvolvimento de práticas de cocriação, a participação em exposições e publicações coletivas internacionais e intergeracionais ou até a adesão à Arte Postal ilustram inequivocamente o seu envolvimento numa intensa rede de comunicação transnacional e, consequentemente, o caráter translocal da sua obra.

Assim sendo, no ano em que António Aragão completaria cem anos, a revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas edita o seu número anual impresso, com o tema de capa António Aragão, antena receptiva (1921-2008), em colaboração direta com o grupo dinamizador das iniciativas intituladas MULTIPLICIDADE DA EXPERIÊNCIA. António Aragão (1921-2008), antena receptiva, com o propósito de evocar o centenário do autor madeirense.

Tomando a metáfora de Aragão como mote (antena receptiva), e adotando a dinâmica colaborativa, interdisciplinar e translocal que caracterizou a sua obra, o n.º 4 da revista TRANSLOCAL, experimentando o cruzamento do formato impresso com o formato digital online, apresenta-se, assim, como um espaço de simultânea captação e irradiação do trabalho académico, de criação artística e de dinamização cultural desenvolvido sobre e com a obra de António Aragão, no âmbito da evocação do seu centenário. Publicará uma seleção de ensaios e artigos resultantes das comunicações apresentadas no Colóquio os sinais são as evidências que permanecem sempre apontando (promovido na Universidade Fernando Pessoa nos dias 22 e 23 de julho de 2021), e editará, na secção Olhares Cruzados, registos documentais, testemunhos e reflexão crítica que dêem conta das dinâmicas criativas e culturais desenvolvidas no âmbito quer da Exposição um desejo inconcebível de abrir todas as portas (programada pela Casa da Cultura de Santa Cruz – Casa do Revoredo, na Madeira), quer das Evocações a imaginação passa de espelho receptivo a operante que decorrerão no Funchal, Calheta e Santa Cruz em setembro de 2021.

Procurando alargar essa dinâmica de captação e irradiação de conhecimento sobre a obra de António Aragão, o n.º 4 da revista TRANSLOCAL, abre agora o convite a outros investigadores e criadores que pretendam associar-se à evocação desse centenário, publicando trabalho em duas das secções da nossa revista: Ensaios Visuais e Diálogos.

As propostas para publicação (texto completo e/ou imagens, no caso de trabalhos a incluir na edição impressa; registos vídeo, no caso de trabalhos a publicar em linha, no website da TRANSLOCAL) deverão ser enviadas para a coordenação da revista (translocal.revista@mail.uma.pt) dentro dos prazos que abaixo se indicam. A aceitação destas propostas dependerá do respeito pelas normas de edição que seguidamente se explicitam e da sua validação por pares, de acordo com os critérios internacionais de dupla avaliação cega.

As línguas de trabalho adotadas pela revista TRANSLOCAL são o Português e o Inglês. Os textos redigidos em Português poderão seguir ou não a norma do Acordo Ortográfico de 1990, devendo o autor declarar a opção seguida, em nota.

.
Ensaios Visuais – submissão de propostas até 31.07.2021

Acolher-se-ão com interesse ensaios visuais (ou audiovisuais) que dialoguem com a obra multifacetada de António Aragão ou que, de algum modo, reflitam sobre questões, metodologias, propostas temáticas, processos criativos, etc. que tenham assumido relevância ao longo do seu percurso de vida. Os ensaios visuais deverão assumir um dos seguintes formatos:

  1. até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras;
  2. vídeo + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras. 
.
Diálogos – submissão de propostas até 15.06.2021

Acolher-se-ão com igual interesse testemunhos de caráter mais ensaístico, mais biográfico ou criativo sobre o convívio com António Aragão: o convívio pessoal e/ou profissional daqueles que o conheceram em vida; mas também o convívio mediado pela leitura da sua obra. 

Nesta secção, aceitar-se-ão trabalhos com manifesta qualidade, que contribuam para a divulgação e problematização da obra de António Aragão e que adotem um de dois formatos:

  1. formato escrito: texto em Português ou Inglês com uma extensão não superior a 2500 palavras, respeitando as normas de edição seguidas pela TRANSLOCAL (ver aqui);
  2. formato vídeo: vídeo com uma duração máxima de 15 minutos, recorrendo também ao Português ou Inglês como línguas de comunicação.

Privilegiar-se-ão testemunhos que abordem os temas discutidos no Colóquio os sinais são as evidências que permanecem sempre apontando:

    1.  um céu azul por cima e um pitoresco turístico em volta | história e etnografia [antónio aragão investigou a história, o urbanismo, a arqueologia e a etnografia do arquipélago da Madeira: qual a importância e a atualidade dos seus estudos?]; 
    2.  ler é igual a ver e ver é igual a ler | pintura e escultura [antónio aragão criou pinturas, desenhos, aguarelas, colagens, livros de artista, esculturas: que desafios para um entendimento da arte são levantadas por essas obras?];
    3.  forças semânticas imprevistas | poesia e prosa [antónio aragão escreveu poemas, romances, contos, crónicas e teatro: qual a relevância desses textos para compreender a multiplicidade da literatura?];
    4.  novas morfologias | concretas e visuais [antónio aragão compôs obras caracterizadas pela espacialização, constelação e visualismo: qual o lugar do autor no contexto do experimentalismo literário?];
    5.  a poesia deve ser tomada por todos os sentidos | tecnologia(s) e suporte(s) [antónio aragão em simbiose com fotocopiadoras, computadores, vídeo,… mostrou-se atento ao som e à performance: que estímulos na sua obra permitem pensar a sociedade mediada?];
    6.  o artista apenas oferece uma estrutura | estética e poética [antónio aragão ensaiou crítica e teorização das artes: que nos dizem esses exercícios sobre o seu momento e que aspetos do seu pensamento ainda perduram?];
    7.  qualquer coisa para comunicar | edição e difusão [antónio aragão organizou e dinamizou publicações coletivas, exposições, debates e intervenções: que marcas deixou a sua ação comunicativa?];
    8.  um certo convívio social e humano | correspondência e rede [antónio aragão envolveu-se na arte por correio e correspondeu-se com agentes da cultura e das artes do seu tempo: que rasto dessas interlocuções identificamos?];
    9.  atitude gostosamente polémica | intervenção e movimento(s) [antónio aragão era um provocador e agitador de ideias: que nos ensina o seu espírito crítico sobre a importância de desviar (d)as normas?];
    10.  inter-acção: acto-mútuo de concordância criativa | diálogo e comunicação [antónio aragão escreveu a várias mãos com outros e influenciou artistas e poetas: quem se declara e se apresenta?].

Os testemunhos escritos, depois de validados para publicação, constarão na secção Diálogos da edição impressa do n.º 4 da TRANSLOCAL. 

Os testemunhos em formato vídeo, depois de validados para publicação, serão disponibilizados online no website da TRANSLOCAL e serão projetados durante o Colóquio os sinais são as evidências que permanecem sempre apontando que  terá lugar nos dias 22 e 23 de julho de 2021, na Universidade Fernando Pessoa, em formato online via Zoom.

Até 30.09.2021, a coordenação do n.º 4 da TRANSLOCAL. ANTÓNIO ARAGÃO, antena receptiva (1921-2008) informará os autores das propostas que forem aceites e, após a conclusão do processo de revisão final e paginação, a revista será publicada no primeiro trimestre de 2022.

n.º 3 | CINEMA(S) PERIFÉRICO(S)  (2020)
data limite para envio de propostas:  31 de janeiro de 2020   31 de março de 2021                       Cfp Português   Cfp English     
Coordenadora Convidada: Maria do Carmo Piçarra  (ICNova e UAL)
Coordenadora TRANSLOCAL: Ana Salgueiro (UMa-CIERL, CECC-UCP e DRABM/CEHA-AV)
.
 

Fenómeno cultural gerado no contexto de uma modernidade urbana, cosmopolita e escopofílica, em que a invenção de novos aparelhos e técnicas de registo e de projeção de imagens se cruzava ora com o experimentalismo estético e criativo, ora com o interesse jornalístico, científico e artístico na documentação da realidade, o cinema assumiu um protagonismo axial naquilo que Michel de Certeau (1990) designou como a invenção do quotidiano. Determinante para a cristalização desse regime visual simultaneamente eufórico e fóbico, transgressivo e esclarecedor, como a ele se referiu Isabel Capeloa Gil (2007), o cinema contribuiu decisivamente para a reconfiguração das sociedades contemporâneas, para a definição das suas fronteiras e para a hierarquização dos seus sistemas ecossocioculturais, ao potenciar a circulação, a transferência e a reimaginação dos valores e dinâmicas sociais, culturais, políticas e económicas que organizaram o tecido urbano a partir do final do século XIX.

Este relevo não invalidou, porém, que o cinema ocupasse também uma certa periferalidade nos sistemas culturais, artísticos e científicos. Tal sucedeu tanto pelo seu carácter impuro e, por vezes, massificado(r), frequentemente oscilante entre a comercialização do entretenimento e da informação, e a propaganda ideológica; como pelo seu discurso híbrido e pelo gesto radical da vanguarda cinematográfica, verificado tanto ao nível da experimentação criativa na conceção da linguagem fílmica, quanto ao nível das imagens de mundo selecionadas e disseminadas, ousando dar voz a uma pluralidade de narrativas oculta(da)s nas representações dominantes dessas e nessas sociedades, ou tornando visíveis formas alternativas de as pensar, de nelas agir e de as reconstruir de forma menos hegemónica.

Produto e produtor do mundo urbano contemporâneo, nessa oscilação entre fenómeno cultural de massas e fenómeno cultural periférico ou de vanguarda, o cinema integrou na sua própria classificação taxonómica essa dualidade tipológica, na verdade bem mais volúvel e complexa do que a dicotomia pode sugerir.

Cinema periférico é uma das designações usadas para referir a produção de filmes à margem de Hollywood. Desde que (e superando a primazia inicial do cinema francês) o cinema norte-americano, através de um modelo de produção, distribuição e exibição, se tornou hegemónico em quase todo o mundo, as cinematografias de outros países e regiões foram consideradas – e assim designadas – como periféricas, em relação com esse suposto centro, que não só é um centro imaginário como impôs um sistema de representação. A implicação mais evidente dessa hegemonia foi sublinhada por Guy Hennebelle no texto seminal Os Cinemas Nacionais Contra Hollywood (1978), ao citar Glauber Rocha e Jean-Luc Godard quando estes denunciam como, através dos filmes, se impôs uma padronização da sociedade que assenta num modelo norte-americano e que distorce a realidade e a diversidade mundial. Essa constatação gerou um espaço de resistência identitária, que se aplica não apenas à produção dos filmes, mas inclui a reflexão sobre o imaginário por eles proposto.

Em alternativa ao uso da expressão cinema periférico – ou da sua declinação no plural –, o cinema produzido fora de Hollywood tem sido perspetivado usando a categoria cinema do mundo (world cinema), que Lúcia Nagib tem pensado a partir de considerações sobre o realismo cinematográfico, propondo alternativamente a designação cinema realista, sobretudo no recém-publicado Realist cinema as world cinema (2020).

Na linha de pensamento sobre um cinema do mundo contraposto ao cinema de Hollywood, inclui-se a reflexão sobre os cinemas nacionais, sobretudo para enquadrar e analisar a intensificação da produção europeia, do Médio Oriente, de parte da Ásia e América Latina no final do século XX, importando aqui realçar o contributo de Jean-Michel Frodon (1998) para pensar como as nações se projetaram (ou não) através das suas cinematografias. Porém, este paradigma é de alcance limitado para considerar quer a diversidade do cinema feito à margem de Hollywood quer os filmes feitos como coprodução de vários países.

Refira-se ainda o conceito accented cinema, proposto por Hamid Nacify para enquadrar o cinema feito por indivíduos e grupos com experiências e práticas culturais não ocidentais, e a sua fecundidade para pensar representações filmadas alternativas. A arqueologia do surgimento deste conceito de cinema periférico remete inevitavelmente para a definição de terceiro cinema, proposta pelos realizadores argentinos Octavio Getino e Fernando Solanas, e inclui práticas integradas que incluem a estética da fome (Glauber Rocha, 1965) e outras de cinema de urgência.

Promovendo uma reflexão sobre o lugar do cinema nos sistemas ecossocioculturais contemporâneos, dando especial atenção ao cinema não hegemónico, feito em diversas periferias (geopolíticas, mas também socioeconómicas, estéticas e disciplinares) – periferias aqui consideradas a partir do modelo centro-periferia pensado pelo economista Samir Amin (1974) –, o n.º 3 anual da revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas, subordinado ao tema “Cinema(s) Periférico(s)”, convida à publicação em três das suas secções: Ensaios; Artigos; e Sugestões de Leitura/Recensões.

Acolher-se-ão com interesse propostas de ensaios escritos e de artigos (entre 2500 e 5000 palavras), ensaios visuais (até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras), e recensões críticas (entre 1000/2000 palavras), que, ocupando-se do tema “Cinema(s) Periférico(s)”, abordem (não exclusivamente) tópicos como:

  • Cinema, saber e poder:
    • hegemonias e periferalidades;
    • propaganda e resistência;
    • colonialismo e pós-colonialismo;
  • Cinema e cartografia do mundo:
    • narrativas e imagens de mundos silenciados e invisíveis no cinema de arte, no cinema científico e no cinema jornalístico;
    • representação cinematográfica denotativa e não denotativa (Nelson Goodman): documentarismo, ficção, ensaio e poesia cinematográficos;
    • marketing turístico e exoticização cinematográfica do local e da cidade;
  • Genealogia e reflexão teórico-conceptual: cinema mainstream, cinema periférico, cinema popular, cinema nacional, cinema do mundo, terceiro cinema (Angela Prysthon), estética da fome, cinema/estética de urgência, Cinema realista (Lúcia Nagib) …
  • Trânsitos e transferências cinematográficos:
    • circulação e indústria cinematográfica: a produção do ‘local’, do ‘global’ e do ‘translocal’
    • tradução intersemiótica: cinema ←→ outras artes;
  • Lugares, edifícios e dispositivos cinematográficos:
    • arquitetura e urbanismo;
    • tecnologia e novos media;
  • Periferias do fenómeno cinematográfico:
    • cinematografias e cineastas esquecidos;
    • o cinema para além do filme, da ação, dos atores e do realizador: cruzamento interartes, encontro transdisciplinar e processo de criação coletiva.

As propostas para publicação serão avaliadas de acordo com os critérios internacionais de dupla avaliação cega por pares, e serão aceites trabalhos em Português e em Inglês, com manifesta qualidade, que contribuam  para a reflexão proposta  com o tema de capa do n.º3 da TRANSLOCAL e que respeitem as normas de edição adotadas pela revista e aqui disponibilizadas.  Os textos redigidos em Português poderão seguir ou não a norma do Acordo Ortográfico de 1990, devendo o autor declarar a opção seguida, em nota.

Por se tratar de uma revista publicada no Funchal, acolher-se-ão com interesse propostas que considerem a produção de cinema na e sobre a Madeira, e relativa à realização cinematográfica por autores madeirenses.

As propostas (texto completo e eventuais imagens) deverão ser enviadas até 15 de Fevereiro de 2021, para a coordenação da revista (translocal.revista@mail.uma.pt), incluindo também os seguintes elementos:

  •  um resumo da proposta de texto submetida, em português e em inglês (até 200 palavras);
  •  nome do(s) autor(es) e uma breve nota curricular (até 100 palavras).

Até 30 de Março de 2021, a coordenação da revista informará os autores das propostas que forem aceites e, após a conclusão do processo de revisões finais e paginação, a revista será publicada ainda no primeiro semestre de 2021.

n.º 2 | MODERNIDADES (2019)
data limite para envio de propostas: 15 de outubro de 2019                                                                                                                            Cfp  
Coordenadoras Convidadas: Ana Isabel Moniz (UMa-FAH e ILCML-UP) e Leonor Martins Coelho (UMa-FAH e CEC-UL)
Coordenadora TRANSLOCAL: Ana Salgueiro (UMa-CIERL e CECC-UCP)

Modernity, of course, has no single meaning, not even in one location […]. Globally and locally, modernity appears infinitely expandable […] a Tower of Babel with too many levels to climb […]: vertigo out on a limb, whirld up into a vortex of the new. Yet I also rejoice. Change is what drew me to modernismo in the beginning. Why should it ossify? Why should the fluid freeze over, the undecidable become decided?

Susan Stanford Friedman, Planetary modernism. Provocations on modernity across time, p. 49

Em março de 1915 era publicado, em Lisboa, o n.º 1 de Orpheu. Revista Trimestral de Literatura, um periódico cujo foco de interesse ultrapassaria em muito o da criação literária. Buscando o novo e o moderno, Orpheu (e muitas outras publicações periódicas suas sucedâneas) pretendia romper com os valores e as práticas culturais dominantes no sistema cultural português. O chamado I Modernismo desenvolvia-se, assim, num contexto político e cultural ambivalente. Se Lisboa era, por um lado, capital de um ‘império colonial’ e do sistema cultural nacional, por outro, era uma cidade marginal em relação a Paris e às principais metrópoles europeias.

Tal como a Lisboa de 1916, também outras localidades e cidades mais pequenas (europeias e de outros continentes) assumem um carácter paradoxal. Por um lado, são percecionadas como periferias em relação às grandes metrópoles ocidentais, sem contudo deixarem de ser centros de referência afetiva, cultural e identitária para quem nelas nasceu e/ou as habita. Por outro lado, enquanto espaços de trânsitos e de en-contros tantas vezes inusitados, essas localidades e cidades da província ou até dos impérios são/foram também realidades socioculturais e políticas marcadas pela transgressão e, nessa medida, espaços de inovação e (re)criatividade.

Deslocando o foco da atenção académica para espaços, fenómenos culturais, sujeitos e/ou perspetivas epistemológicas e criativas considerados periféricos, o n.º 2 da edição anual e impressa da revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas, subordinado ao tema “Modernidades”, desafia à reflexão sobre o mapa dos modernismos e das modernidades. Um mapa que, como lembra Susan Stanford Friedman (2012), na nossa contemporaneidade, exige uma revisão. Não podendo deixar de dar atenção aos centros metropolitanos ocidentais, essa nova cartografia das modernidades deverá também (re)ver a densidade cultural, epistemológica e re-criativa de outros locais e cidades (assim como de áreas/fenómenos marginais situadas nas grandes metrópoles), interrogando-se sobre as modernidades e os modernismos que aí se construíram. De acordo com Terry Eagleton (1970) e Osvaldo Silvestre (2008), o alto modernismo europeu foi protagonizado por “gente da província em migração para as grandes capitais da Europa, as quais segregarão por isso uma cultura da internacionalização e da desfamiliarização” (Silvestre, 2008).

Mas o que terá acontecido em sentido inverso, i. e., dos centros metropolitanos para as suas periferias? Como foram experienciadas as vanguardas do início do século XX e outros modernismos e modernidades em espaços geopolíticos e culturais considerados periféricos? Como responderam as sociedades e os sujeitos locais (europeus e coloniais) ao novo proposto pelos modernismos dominantes nas grandes cidades ocidentais? Essas outras localidades e cidades da província ou do império terão sido um absoluto vazio cultural, destituído de sujeitos capazes de dialogar criticamente com esses modernismos e essas múltiplas modernidades? Poderão as margens ter produzido, localmente, um discurso próprio sobre as ideias e fenómenos culturais criados e discutidos nos centros de maior gravitação artística, social e política? Que papel tem sido atribuído aos espaços geoculturais periféricos e/ou a abordagens com enfoque local, na construção da narrativa sobre os vários modernismos e as diversas modernidades?

Assim, no ano em que se assinala o centenário do segundo trânsito da Madeira para Paris (1919) de três artistas plásticos funchalenses – Henrique Franco, Alfredo Miguéis e Francisco Franco-, uma deslocação e uma estada intermitente que, segundo Carlos Valente (2015), viriam a ser decisivas para a realização, no Funchal de 1922, da pioneira exposição internacional de arte moderna – a exposição do “Grupo dos Seis” -, o n.º 2 | Modernidades da revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas convida à publicação em três das suas secções:

  1. Ensaios;
  2. Artigos;
  3. Sugestões de Leitura/Recensões.

As propostas para publicação serão avaliadas pela Comissão de Leitura deste número e deverão contribuir quer para a reflexão sobre o(s) conceito(s) de Modernidade, quer para a análise crítica dos fenómenos geopolíticos, sociais, económicos, geofísicos, biológicos, culturais, artísticos, psicológicos e afetivos que esses conceitos podem referir, quer ainda para a discussão dos problemas que esses fenómenos e experiências implicam.

Os casos de estudo tomados como objeto de análise e discussão poderão reportar-se tanto à cidade e às culturas do Funchal (aqui também entendido como Funchal-expandido) ou de outras localidades da Madeira, quanto a outras cidades e a outros locais.

Acolher-se-ão com interesse, propostas quer de ensaios escritos e de artigos (entre 2500 e 5000 palavras), quer de ensaios visuais (até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras), quer de recensões críticas (entre 1000/2000 palavras), redigidas em português, inglês ou francês, que, ocupando-se do tema “Modernidades”, abordem (não exclusivamente) tópicos como:

  1. Modernidades metropolitanas e modernidades locais e periféricas: dicotomias e/ou implicações? Perspetivas multidisciplinares;
  2. A marginalidade em agentes e fenómenos culturais dos séculos XX e XXI;
  3. Os media na difusão, legitimação e questionação de valores e discursos modernos;
  4. O Museu, o Arquivo, a Biblioteca, a Atividade Editorial, a Escola: o seu papel na revis(itaç)ão dos modernismos e das modernidades;
  5. Mobilidades modernas: tradução, modalizações culturais e transculturalidade;
  6. Natureza, arte, tecnologia e ciência: construção de saberes modernos; (re)criação; relação humana com o contexto eco-sociocultural;
  7. Repensar a polis e o espaço urbano modernos;
  8. Sujeito moderno: crise e psicanálise.

As propostas de ensaios e de artigos deverão ser enviadas até 15 de outubro de 2019, para a coordenação da revista (translocal.revista@mail.uma.pt), incluindo também os seguintes elementos:

  • um resumo da proposta de texto submetida, em português e em inglês (até 200 palavras);
  • nome do(s) autor(es) e uma breve nota curricular (até 100 palavras).

Acolher-se-ão igualmente com interesse recensões críticas de livros que, provenientes de várias áreas académicas, culturais e artísticas, abordem questões relacionadas quer com os conceitos, fenómenos e experiências das modernidades, quer com as problemáticas que desses fenómenos e experiências decorrem. As propostas de recensões críticas deverão ser submetidas para o mesmo e-mail, até 15 de outubro de 2019.

Até 30 de outubro de 2019, a coordenação da revista informará os autores das propostas que forem aceites, procedendo-se depois ao processo de paginação e revisão dos textos selecionados para publicação.

n.º 1 | (TRANS)LOCALIDADE & CULTURAS URBANAS (2017/2018)

Data limite para submissão de propostas: 10 de Novembro de 2017

Coordenadores:  Ana Salgueiro e Duarte Santo

 

“Translocality draws attention to multiplying forms of mobility without losing sight of the importance of localities in people’s lives”
Oakes and Schein, Translocal China, Linkages, Identities and the Reimagining  of Space

“A passagem da “cidade para o urbano” arrastou uma metamorfose profunda da cidade: […]
que passou a centrífuga; […] a uma geografia desconfinada[…] difusa e fragmentada;[…]
passou a ser um transgénico que assimila e reprocessa elementos […], passou a sistema
de vários centros; de ponto num mapa, passou a mancha”
Álvaro Domingues, “A Rua da Estrada”

Refletir, hoje, quer sobre o que é o translocal e a translocalidade, quer sobre o que é a cidade e o urbano (e respetivas culturas), implca colocar estes conceitos, fenómenos e experiências em correlação com outros que lhes são alternativos ou complementares: por um lado, local/localidade/localismo, região/regionalidade/regionalismo, nação/nacionalidade/nacionalismo, globalização e cosmopolitismo; e por outro lado, campo/rural/ruralidade.

O caráter catastrófico, fragmentário e palimpséstico que Walter Benjamin (2003) identificou na experiência da temporalidade moderna, a liquidez que Zygmunt Bauman (2012) diagnosticou na modernidade tardia, ou a reflexividade crítica que Ulrich Beck (1994) também apontou no contemporâneo deixavam de se compaginar, no final do século XX, com conceções exclusivamente lineares e progressistas de tempo, com perspetivas deterministas e meramente materiais do espaço (Lefebvre, 1991; Massey, 2005; Harvey, 2009), ou até com paradigmas estanques e estáticos de fenómenos como a fronteira ou a comunidade (Agamben, 1993; Nancy, 2000).

A cidade e o urbano,  pensados e experienciados como lugares-tempos expandidos e instáveis, apresentavam-se como uma tessitura física, social, política e cultural fragmentária, mas densa, contaminada e em turbulenta metamorfose (Crang, 2000). Surgiam como unidades orgânicas, tensionais e não-homogéneas, onde o limiar com o rural e com o estrangeiro se dissolvia e onde diversas temporalidades se cruzavam, numa trama que era permeável ao estranho, à diferença e ao novo, mas que, simultaneamente, também se definia como corpo autofágico que se vai nutrindo das ruínas do passado, para, de forma complexa e por vezes caótica, se reinventar quotidianamente (Domingues, 2010).  Cidade e urbano configuravam-se então (como hoje) como palimpsestos e arquipélagos transfronteiriços, marcados por dinâmicas que ultrapassavam o local; como sistemas rizomáticos, cuja fluidez encontrava pontos de ancoragem e cristalização que se estendiam para além das clássicas muralhas físicas da cidade e para além das normas que aí foram sendo dominantes.

A par com esse entendimento do que era/é a cidade e o urbano, também translocalidade e translocal surgiam, nesse mesmo período, como renovação conceptual desses outros termos que lhes são tangenciais. Sujeitos à usura do tempo e à alteração fenomenológica, histórica e contextual, local/localidade/localismo, enquanto conceitos operativos, tornavam-se limitadores quer na reflexão sobre os sistemas ecossocioculturais modernos, quer na construção de respostas para as interrogações e para os desafios que a contemporaneidade colocava. Por um lado,  a vaga crescente dos processos de mobilidade humana e cultural era intensificada com o desenvolvimento tecnológico, com o aparecimento de novos media e (com estes) de renovadas modalidades de comunicação e de relação interpessoal, intercultural e económica, agora também marcadas pelo virtual, pela simultaneidade transfronteiriça e por experiências mais complexas de espaço/tempo (Beck, 2007; Greenblatt, 2010). Por outro lado, o paradigma oitocentista do Estado-Nação (tantas vezes reproduzido, a uma escala menor, no paradigma da Região) esgotava-se (Sousa Santos, 1999), exigindo a reequação dos processos de identificação política e geocultural, das narrativas identitárias e das relações de pertença comunitária (Agamben, 1993; Nancy, 2000). Simultaneamente, a tendência hegemónica da globalização, a vertigem do desenraizamento cosmopolita e esses novos entendimentos de espaço/tempo potenciavam uma profunda desestabilização e pulverização das narrativas identitárias.

Deste modo, translocal e translocalidade questionavam e desconstruiam a dicotomização radical e acrítica que, não raras vezes, se estabelecia quer entre o que era local e nacional, quer entre o que era local e global ou cosmopolita (Greiner e Sakdapolrak, 2013). Passavam a reportar-se a fenómenos e experiências culturais, sociais, políticos, históricos, económicos, artísticos ou até biológicos, geofísicos, psicológicos e afetivos implicados em dinâmicas, mais ou menos transgressivas, de trânsito, de flutuação, de transferência e de metamorfose, fosse de sujeitos, valores, substâncias e imaginários, fosse de bens e produtos. Contudo, esses fenómenos e experiências nem por isso decorriam de uma desterritorialização absoluta, ou de um radical desenraizamento temporal que os projetassem para fora de um aqui-agora.  O prefixo trans- inscrevia (e subscreve ainda hoje) o caráter dinâmico, transformativo, relacional e transgressivo dessa modalidade contemporânea de experienciar e pensar o local. Locus, na raiz etimológica de local, sublinhava, por seu turno, que essa flutuação ou deriva, tal como a (con)fusão de fronteiras delas decorrentes não se esgotavam em si mesmas.

Neste quadro, regressar ao local, para o repensar criticamente, agora numa articulação de diversas escalas e tempos que nele se cruzam, surgia como tentativa de resposta àqueles abalos, exigindo, no entanto, uma outra conceptualização, que ultrapassasse o confinamento das fronteiras do local a um enraizamento estático, físico e geográfico (Appadurai, 2003: 178).

Como notam Katherine  Brickel e Ayone Datta (2011: 3-4), na senda de autores como Appadurai, translocal e translocalidade designam fenómenos e experiências “place-based rather than exclusively mobile, uprooted or ‘travelling’”. Enquanto lugares expandidos, resultantes do encontro e negociação entre vários locais-tempos, a existência desses fenómenos e experiências produz-se localmente (Appadurai, 2003:178).

Assim, o número inaugural da revista TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas, abre o convite à publicação em três  das suas secções:

  1. Ensaios (escritos e visuais)
  2. Artigos
  3. Sugestões de Leitura (Recensões Críticas)

As propostas para publicação serão avaliadas pela Comissão de Leitura da revista e deverão contribuir quer para a reflexão sobre os conceitos de (trans)localidade e culturas urbanas, quer para a análise crítica dos fenómenos geopolíticos, sociais, económicos, geofísicos, biológicos, culturais, artísticos, psicológicos e afetivos que esses conceitos podem referir, quer ainda para a discussão dos problemas que esses fenómenos e experiências implicam.

Os casos de estudo tomados como objeto de análise e discussão poderão reportar-se tanto à cidade e às culturas urbanas do Funchal (aqui também entendido como Funchal-expandido), quanto a outras cidades e a outros locais marcados pela translocalidade.

Acolher-se-ão com interesse, propostas quer de ensaios escritos e de artigos (entre 2500 e 5000 palavras), quer de ensaios visuais (até 5 imagens + texto complementar, entre 500 e 1000 palavras), quer de recensões críticas (entre 1000/2000 palavras), redigidas em português ou inglês, que, ocupando-se do tema “(Trans)Localidade e Culturas Urbanas”, abordem (não exclusivamente) tópicos como:

  • o local, o urbano e a cidade como lugares-tempos expandidos, como palimpsestos e/ou arquipélagos transfronteiriço: questões de identidade e património;
  • mobilidade humana e cultural: movimentações centrífugas e/ou centrípetas, entre a vertigem do trânsito e a pulverização de enraizamentos locais;
  • desloca(liza)ções, conflito e poder;
  • a plasticidade dos territórios locais e urbanos:
    • processos de coprodução espacial (dinâmicas top-down e bottom up);
    • sustentabilidade ecológica, (des)ordenamento territorial, riscos, resiliência;
  • paisagens locais e urbanas como fenómenos metamórficos e como territórios híbridos: conservação, subversão, (re)criação;
  • a complexidade babélica do (trans)local e do urbano contemporâneos:
    • a questão do encontro e da variação linguísticos;
    • a questão da (in)traduzibilidade linguística, social, cultural e artística;
  • a (re)imaginação do local e/ou da cidade: narrativas e representações literárias e fílmicas;
  • discursos artísticos contemporâneos, site-specificity, transgressão e deslocalizações (re)criativas;
  • turismo e a reinvenção do local e/ou do urbano: do virtual à experiência empírica; processos de turistificação

As propostas de ensaios e de artigos deverão ser enviadas até 10 de novembro de 2017, para a coordenação da revista  (translocal.revista@mail.uma.pt), incluindo também os seguintes elementos:

  • um resumo da proposta de texto submetida, em português e em inglês (até 200 palavras);
  • nome do(s) autor(es) e uma breve nota curricular (até 100 palavras).

O n.º 1 de TRANSLOCAL. Culturas Contemporâneas Locais e Urbanas publicará uma bibliografia de referência sobre o seu tema de capa. Neste sentido, acolher-se-ão com interesse recensões críticas de livros que, provenientes de várias áreas académicas, culturais e artísticas, abordem questões relacionadas quer com os conceitos, fenómenos e experiências da translocalidade e das culturas urbanas, quer com as problemáticas que desses fenómenos e experiências decorrem.

As propostas de recensões críticas deverão ser submetidas  para o mesmo e-mail, até 10 de novembro de 2017.

Até 30 de Novembro de 2017 a coordenação da revista informará os autores das propostas que forem aceites, procedendo depois ao processo de edição e dos textos seleccionados para publicação.